23 maio 2010

O Vão da Porta 3



Ligeiramente trêmulo, estendi o arranjo de rosas.

Nesse instante meu corpo todo se rendeu a um frenesi, um estado caótico em que minha cabeça parecia girar incontrolavelmente.

Uma deliciosa sensação de bem-estar invadiu minha alma. Quero falar. Será que devo? Não... Ainda não. Enquanto abria lentamente a porta, fui colocando meus pensamentos no lugar, ajeitando a bagunça, ou pelo menos parte dela. A minha bagunça, a minha insana ganância por aventura. Afinal, estragar esse momento tão único seria um tiro no próprio pé.

E o que menos quero é sair ferido.

Mas os princípios de falha desapareceram, agora que você tocou em minha mão e aceitou, mesmo que relutante, a minha primeira prova de arrependimento.
O nosso recomeço.

“E então, quer me dizer alguma coisa?”, seus olhos continuam os mesmos e suas palavras, tentando disfarçar, transpareciam uma ponta de carinho.

“Várias coisas... Você quer escutar agora?”. O medo de me explicar, sem saber quais argumentos usar contigo, gelou-me. Todavia, sua cabeça girou de um lado a outro, negando o desejo de escutar meias verdades. Com a porta completamente aberta, esperando minha entrada, pude ver o interior de seu refúgio; um ambiente somente seu; perfumado, limpo, aconchegante, discreto...

Desculpe, mas vou invadi-lo novamente.

Vou ingressar nessa última aventura antes de dizer que te amo. Uma aventura que vivi anos atrás e não consegui esquecer. Talvez porque tenha sido muito bom. Talvez porque eu tenha gostado demais de você.

E... Ainda gosto? Ainda espero de ti compreensão, carícia e mil beijos eternos?
Pé ante pé, entro devagar para não perturbar sua ordem. O sol, curioso e atrevido, lançou-se pelas cortinas entreabertas.

Continuo trêmulo e você decidida. Parece que invertemos os papéis e a novela perdeu parte de seu brilho. Pois hoje interpreto o coadjuvante covarde. Narcisismo meu? Confesso que sim, porém não nego o quanto estou indefeso. Inseguro. Não fique vasculhando cada canto de mim com esses olhos, os mesmos olhos que me prometeram eternidade, os mesmos olhos que, refletidos nos meus, viram uma verdadeira paixão. E gritaram de alegria, choraram de saudade, riram desesperados.

De repente fico tonto. As imagens vão se confundindo, brincando comigo.

Literalmente, pareço estar sem chão. Meu estômago está embrulhado.

“O que você tem? Precisa de alguma coisa?”, pude notar a aflição em sua voz... A preocupação com meu súbito mal estado.

As cores estão dançando, as luzes vão apagando... Eu preciso...

“De você...”