30 março 2010

Oração Poética


Quando nasci, um Serafim desses de pompa e poder,
De rosto enrugado, olhos cansados e barba branca,
Empoleirado no alto de seu trono
Gritou, fazendo farfalhar sua túnica azul:
“Anda traste pulguento.
Corre atrás da tua vida porque ela tem pressa
E a morte não espera o final do dia.
Desce logo e faz teu destino, criatura sedentária.
Busca seus sonhos e escreve sua história!”
E eu desci meio sobressaltado e sem jeito.
As ruas, as avenidas, as praças e os prédios.
Tudo isso me fascinou.
Confesso que acho o litoral carioca um verdadeiro espetáculo.
Mas, como bom paulista que sou adoro caminhar no Ibirapuera
E ver o show de luzes durante o Natal.
Acredito cegamente nas dores da saudade.
Tenho minha própria fé e meu Deus não se confunde em religiões.
Mas sempre mando rezar missa para mau-olhado.
Sou poeta quando posso e quando nada me impede.
No mais sou estudante.
E, diga-se, sinto aversão a palavra vestibular.
Sempre cumprindo o que o tal Serafim falou:
Escrevo o meu destino, já que buscá-lo é tarefa dos metafísicos.
A felicidade que me convém provém dos outros,
Sou alegria pura e pouco explorada.
E, quando esse anjo meio atravessado
Gritar-me novamente
Pedindo para subir,
Meu amigo sou honesto em dizer
Que pensarei duas vezes antes de atender ao chamado.
Em nome dos pais, dos filhos e de todos os santos
Amém...

20 março 2010

O Vão da Porta 2


Não sei o que dizer.
Não sei ao certo se há alguma coisa a ser dita. Simplesmente estou perplexa.

Será um fantasma? Afinal, depois de tanto tempo, parece que me esqueci de como você é. Ou, pelo menos de como você era. Eu te amava, sabia disso? Eu tinha planos, tinha desejos, e o mundo não girava somente ao redor de suas vontades! Eu possuía um futuro escrito, acentuado e bem finalizado.

Mas, minha felicidade me deixou, foi embora com você, sem justificativa, sem piedade... Fiquei de mãos vazias, olhos vendados. Fui jogada à própria sorte. Como uma boneca de pano, que não fala, não respira e nem sente. Apenas um objeto.

Agora, você bate em minha porta dizendo: Tudo bem. Invade a minha vida outra vez, arrancando de mim o meu bem mais precioso: a tranqüilidade.

Meu coração vai batendo tal como um violoncelo desafinado.
Estou tentando conter as lágrimas. Cansei de derramá-las por ti. Cansei de ver o céu e procurar nas estrelas uma esperança de brechó. Uma oração milagrosa, uma frase amaldiçoada. Com o passar dos dias fui sentindo um amargo gosto no coração.

Após três meses de sua partida, decidi pegar nossas fotos e montar um álbum de recordações. Passei dois dias inteiros nesse projeto angustiante. Só pude dormir depois de vê-lo e revê-lo pronto. Lembro, como se fosse ontem, que tranquei a porta do meu quarto e minha mãe, do outro lado gritava histérica, que eu estava enlouquecendo. Mal sabia ela que já havia enlouquecido, por sua causa. Afinal, sempre havia sido você, do início ao fim meu sol era você. Minha estrela guia, a alma aventureira que se juntava a minha serenidade...

Sou sincera em dizer que pensei em me matar. Todavia, não pude. Imaginava se você voltaria. E, se voltasse, eu estaria morta... Seria injusto não pedir explicações para sua atitude, certo? Conclui que o céu poderia esperar um pouco mais. Ou talvez o inferno, ou nenhum dos dois. Quem se importa?

Meu mundo foi caindo aos poucos.
Desisti de conversar.
Desisti de sair com os amigos.
Desisti de aceitar ajuda e conselhos.
Desisti de estar aberta à novas experiências.

Só não desisti de vê-lo outra vez. Foi neste instante que notei a minha dependência em seu carinho, e sua ausência ia me ferindo e flagelando.

Resolvi mudar. Fugi de casa no meio da madrugada. Deixei um pequeno bilhete grudado na porta da geladeira. Cortei meu cabelo e fiz mechas avermelhadas. Sai sem destino, com a roupa do corpo, uma pequena bolsa e algumas notas para garantir a sobrevivência.
Comprei um maço de marlboro e coloquei no bolso de trás da calça. Aprendi a fumar sozinha. E também aprendi a parar com o vício, quando minha mãe, em prantos me ligou dizendo que meu avô estava internado, com câncer no pulmão. Não cheguei a vê-lo no hospital, não pude abraçá-lo uma última vez...

Depois de seis meses voltei para casa. Nem eu sei como me virei durante esse tempo todo somente com alguns pares de roupa. Quando deitei na minha cama de novo, chorei, gritei e tive pesadelos.

Amiúde, aquele amor preso no calendário sussurrava em meu ouvido memórias tristes, que abriam enormes rombos em meu peito. Cada anoitecer tirava de mim uma lágrima doída e um pedaço de vida repartido e esmagado.
Certa manhã suturei as feridas e segui meu caminho. Meu avô havia morrido, minha mãe era pura desolação. A casa cheirava a depressão. Lembranças demais, fotos demais, perdas demais. Um completo caos. Mas, foi nesse caos que encontrei minha ordem. Estudei várias semanas o que deveria ter estudado em anos, mas não fiz por estar ao seu lado. Fui recompensada: passei no vestibular. Cursei publicidade. Vi na faculdade um mundo totalmente novo.
Amores novos. Nada duradouro, apenas flertes, sexo e uma despedida digna, sem ressentimentos e promessas de namoro.

Sem o compromisso de estar ao lado de alguém.

Sem o compromisso que nós tínhamos.

Então, não me estenda essas rosas. Eu não mereço rosas roubadas de um jardim qualquer. Muito menos diga que tudo está bem, quando não está. Mas é impossível não reparar...
É incrível: você parece tão diferente, e tão estranhamente igual. Mais maduro, porém, sempre desajeitado. Sério, e também muito brincalhão.
Pare de me olhar. Pare de usar esses artifícios baratos. Já fui pega por eles uma vez. Uma segunda vez seria estupidez.

Mas receio ser uma tremenda estúpida. Será que devo abrir a porta? Por sua culpa estou ficando aflita.
Tudo o que aconteceu comigo é sua culpa. Toda a desolação, toda a loucura, toda a paixão... E eu permiti que isso me atingisse.

“O que quer de mim?” Estou torcendo para que não me responda.
Torcendo para que escancare a porta e entre sem minha permissão. Assim terei motivos para odiá-lo ainda mais.
Contudo, o meu ódio se confunde com meu amor, e aquela tênue linha que os separa deixa de existir.
O que posso fazer? Não há uma resposta de ti. Só esses olhos de cão sem dono.
E eu: choro por dentro e por fora. Afogando-me no passado e rejeitando suas flores. Mas, devo confessar que são lindas. Não acredito no que vou dizer, mas digo antes que morra de frustração.

“Dê-me logo o buquê... E entre.”

19 março 2010

Canção do Exílio

Minha terra tem presídios,
Facções e o P.C.C.,
Os ladrões que lá são presos
Tomam até vinho rosê.

Nosso céu tem mais carbono e gás metano.
Nossas várzeas agora são grandes avenidas.
Nossos bosques tem mais projetos sociais,
Cesta básica, escola para todos e outras iniciativas.

Ao usar cartões de crédito
Minha conta estourou!
Minha terra tem bancários,
Malditos gerentes e o Cristo Redentor.

Minha terra tem políticos
E seus caprichos de direito.
Caixa um, dois, três, quiçá quatro.
E o povo, lá de baixo, grita contrafeito:

“Minha terra é um coliseu
Onde leões atacam cristãos,
E a máfia, rindo no Congresso
Assiste a essa destruição.”

Mas também há o axé dos carnavais,
O funck, o pagode, o pop e o rock.
Minha terra tem o samba no sangue
E nas ruas das cidades, o hip hop.

Minha terra é a sua também.
Portanto grite alto, pule de alegria,
Pois nós tivemos o pan,
E teremos a copa e as Olimpíadas.

Todavia, o que espero mesmo
Gonçalves Dias, é que até lá
Ainda existam palmeiras
Para cantar seu Sabiá.

13 março 2010

Romântico Violinista



Ao som de um violino,
Doce, agudo, grave ou fino.


Com um belo acústico ao fundo:
O sol beijando a vastidão do horizonte.
É fim de tarde na planície.
As cores vão se misturando:
Azul, laranja, amarelo e branco.
Estou sentado na grama,
Esperando por você.
E, enquanto não chega, vou treinando.
Falando sozinho, decorando para não errar.
Mas, confesso que todo o discurso que fiz
Nem de longe expressa o que realmente quero dizer.
Então por que o escrevi?
...Não sei e, no momento não importa.
Você está chegando, devo me preparar.


Ao som de um violino,
Doce, agudo, grave ou fino.


Declaro-me para ti.
E, Meu Deus, se me chamam de poeta, seu riso é melodia.
Tento disfarçar minha ansiedade em vão.
Quanto mais seus olhos olham os meus,
Mais rápido meu coração vai batendo.
Espero não enfartar, sou muito jovem.
Contudo, troquei as palavras,
Tropecei em meus próprios versos.
Por um instante, tive medo da sua reação.
Medo de perdê-la, sem ao menos conquistá-la.
Mas as evidências são claras:
Seu sorriso envergonhado, minha cabeça baixa:
Com certeza isso é amor.
De repente você busca em mim um abraço apertado,
Um colo, um carinho.
E eu te dou o mundo, a imensidão.
Te dou o meu paraíso e
Seguro em sua mão.
Aquela timidez torna-se intimidade,
Uma lágrima, depois outra e mais outra.
E tudo está completo.
Bem discreta, a noite vem chegando.
As estrelas estão nos assistindo.
E também estão sorrindo,
Brilhando “pálidas de espanto” e alegria.
Minha alma respira aliviada,
E o vento da nova madrugada
Traz aquele “eu te amo” dito entre sussurros e soluços
E repetido inúmeras vezes durante nossa caminhada...


Ao som de um violino,
Doce, agudo, grave ou fino...

09 março 2010

O Vão da Porta


Antes de partir... Eu não lhe disse adeus. Estava ansioso demais, sedento de vontade de ir embora.
E simplesmente fui.
Nada. Nenhuma carta, nenhum sinal nem mensagem. Muito menos uma prévia explicação.
Eu... Queria fugir a qualquer preço. E vejo, hoje, que essa foi minha pior decisão.
Afinal, agora, diante de sua porta, com um pequeno buquê de rosas na mão esquerda e, na direita a minha esperança, não encontro palavras para caracterizar minhas atitudes.
Nenhum pedido de desculpa será suficiente.
Nenhuma lágrima minha compensará a sua tristeza, nenhum esclarecimento de minha parte irá ser suficiente para quitar o número de vezes em que você implorou aos céus, pedindo que eu voltasse.
Mas, finalmente voltei.
E não espero ser recebido com carinho, beijos e um abraço apertado.
Ainda é cedo, bem cedo.
O sol está despontando, você, com certeza está dormindo. Porém, terei de acordá-la.
Não quero que você me entenda, pois sei que é uma tarefa impossível de se realizar.
Eu só quero que você me veja, para que eu possa vê-la também, olhar em seus olhos, sorrir ao seu lado (mesmo sorrindo sozinho). Se dissesse que te quero, estaria sendo honesto.
Se dissesse que te amo, estaria compartilhando uma suave verdade do meu coração.
Se dissesse o quanto desejo o seu rosto junto ao meu, lembraria dos meus dias de solidão. Lembraria de nossa paixão colegial, nossas aventuras adolescentes, nossos braços quentes nas noites de inverno.
Mas, se me perguntasse se eu te mereço, obviamente diria que não.
...Pronto, toquei a campainha. Talvez não devesse tê-lo feito. Talvez sua vida esteja melhor sem mim.
Talvez eu perceba o quanto preciso de você e uma dor, amiúde, irá me incomodar, dentro do meu peito...
E, nessa angústia de esperar e não saber o que fazer, querer e temer perdê-la, eu vou desistindo... Vou me afastando. De novo.
As rosas agora estão no chão, minha cabeça baixou, minha mão ficou gélida. Sinto-me fraco. Faltam expressões que descrevam meus sintomas.
Provavelmente é o mal do meu século. Ou o meu mal, ou o meu bem...
Ou o som dos seus passos do outro lado da porta, a chave entrando no buraco da fechadura e a maçaneta girando levemente...
De repente, seu rosto aparece no vão que separa a porta do batente. Você assustada por ter alguém a esperando tão cedo. Eu, aflito em ver sua reação.
Seus olhos se arregalaram por um instante. Agora, uma lágrima silenciosa desce discretamente, delineando sua face. E outras seguem o exemplo da primeira.
Pensei, primeiramente, em me aproximar. Antes, tenho de recolher as rosas.
Acredito que consigo, somente, estendê-las a você.
Exatamente como eu fiz em nosso primeiro encontro. Lógico que nele havia inocência, onde hoje há expectativas e frustrações.
Aliás, havia muitas coisas em nosso primeiro encontro. Havia o mundo e as estrelas, o céu e o mais puro infinito. E, neste momento, há apenas o diálogo de nossos olhares.
Tão tenso. Tão necessário.
E, se não quiser me ver nunca mais, irei entender. Mas não feche a porta ainda, eu preciso te ver só mais um pouquinho, mesmo sabendo que dessa maneira irei me torturar...
Mesmo sabendo que um dia você terá de fechar a porta, com ou sem a minha presença em sua vida...
Porque eu esperei tanto tempo para te encontrar, tantos fatos a contar... Todavia, a única coisa que posso lhe dizer sem tropeçar na própria língua é:
“Tudo bem...”